Uma paranóia coletiva já criou o Fahrenheit 451 dos quadrinhos

Um período insano da história americana quase arruinou a indústria dos Quadrinhos, por causa de uma censura desnecessária e absurda.

Os Quadrinhos enfrentam censura até hoje

Recentemente a HQ Maus sofreu uma censura de um Conselho Escolar Americano, e isso mostra que os Quadrinhos ainda sofrem com censuras absurdas. Como essa que aconteceu há muito tempo, durante a era do macarthismo, quando disseram que as histórias em quadrinhos eram uma ameaça. Lógico que isso causou um pânico entre as pessoas alienadas, culminando em uma audiência no senado americano, em 1954.

A culpa desse delírio coletivo, foi o Código dos Quadrinhos Americanos, que criaram um conjunto de regras sobre o que as HQs podiam mostrar. Com frases como: “o bem tem que triunfar sobre o mal e o governo precisa ser respeitado”, políticos e religiosos incentivaram essa caça aos Quadrinhos. Tudo isso por causa do conteúdo levemente sangrento e sexual, dos primeiros quadrinhos. Isso levou os pais, dos devotos leitores adolescentes, a se preocuparem com o efeito dessa leitura na cabeça das crianças. Além disso, a Igreja Católica da época permitia que as dioceses locais proibissem certos livros. Entre esses livros, eles rapidamente censuraram à maioria das Histórias em Quadrinhos. Pois quase todas as revistas entraram nas listas de livros considerados impróprios, para a boa juventude católica.

A absurda queima de Quadrinhos

Incentivados por políticos e religiosos, alguns pais preocupados escreveram artigos em jornais locais, criando um falso medo sobre os Quadrinhos. Esses artigos estimularam associações de pais e mestres, que organizaram queimas de HQs. Esse Fahrenheit 451 aconteceu um pouco depois dos nazistas queimarem livros censurados. É triste dizer isso, mas até os próprios alunos lideravam essa queima de de HQs, que eram retiradas das bibliotecas escolares. Além disso, eles incentivavam os amigos a trazerem suas coleções de revistas, alimentando essa louca fogueira.

A História em Quadrinhos The Woman in Red foi censurada

Não podemos esquecer que vários personagens, desenvolvidos durante este período, ainda estão entre os mais populares, até hoje. Estou falando de Mulher-Maravilha, Batman, Super-Homem, Tocha Humana e Capitão América, todos eles criados nessa época insana. Alguns títulos de Quadrinhos dessa época, também exploraram questões de raça e gênero. Pois havia HQs de super-heroínas como The Woman in Red, que enfrentava os senhores do crime e até pilotavam aviões. É lógico que isso incomodava a sociedade careta, que vivia na década de 50.

A maior conquista nessa cruzada contra os Quadrinhos, aconteceu em 1954. Pois nessa época foi publicado o livro The Seduction of the Innocent, escrito por Fredric Wertham, que não tem edição em português. Isso seduziu ainda mais as pessoas desinformadas, que já liam os péssimos artigos dos jornais. Nesse livro o autor faz afirmações absurdas, sugerindo que a Mulher-Maravilha era lésbica, que Batman e Robin eram gays e, por isso, os quadrinhos eram perigosos para as crianças.

A era de ouro dos Quadrinhos

Esse código fez com que os super-heróis se tornassem populares entre criadores e artistas. Pois era muito mais fácil enxertar os princípios do Código dos Quadrinhos, com a história de um super benfeitor. Por isso os super-heróis foram uma aposta segura, pois eles permitiam que os editores, sobreviventes do caos causado pela censura, criassem personagens para um público ávido por aventuras, os adolescentes. Mas, até esse super-heróis ficaram repetitivos, já que os roteiros de quadrinhos da época geralmente consistiam em um vilão pateta, lançando algum ataque covarde. No entanto, antes de destruir o mundo, ele era facilmente derrotado por um super-herói. Como os quadrinhos não tinham mais histórias policiais, de terror, ou de faroeste, os super-heróis passaram a oferece uma HQ inocente e cansativa e as vendas foram caindo.

Ainda bem que uma reação aconteceu, quando grandes criadores foram assumindo as revistas, como Roy Thomas e Jack Kirby, e as histórias começaram a ser mais criativas. Logo depois, Stan Lee finalmente exterminou esse código maligno, em 1971, criando uma história sobre abuso de drogas, na HQ Amazing Spider-Man #96. Essa revista exterminou o poder da censura, como Galactus extermina um planeta. A partir daí, a DC Comics seguiu o exemplo de Stan Lee, criando a própria HQ sobre abuso de drogas, em Green Lantern/Green Arrow #85. Logo depois dessa revolta de Stan Lee, o código foi reescrito e ratificado. Permitindo que os criadores explorassem tópicos mais sombrios, criando vilões mais fascinantes, pois eles eram tão interessantes quanto os super-heróis.

A luta contra a censura é constante e necessária

A censura exterminou várias gerações de criadores e poderíamos ter vários personagens interessantes, que provavelmente surgiriam durante esse período sombrio. Mas, apesar de vencerem a censura, algo incrível aconteceu alguns anos após esse apocalipse das HQs. O autor de The Seduction of the Innocent, resolveu atacar outra indústria em expansão, que havia chegado a dezenas de milhões de lares. Pois em 1959, ele escreveu The War on Children, onde fala sobre os efeitos nocivos da televisão, nas mentes jovens e maleáveis. Ou seja, nossa luta contra a censura e a ditadura tem que ser igual à dos super-heróis que lemos, pois esse tipo vilão, sempre tenta retornar.

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