Adam Warlock não conseguiu expurgar o mal das pessoas e desistiu de ser um deus

Adam Warlock foi criado por Jack Kirby e Stan Lee e fez suas primeiras aparições dentro de um casulo, na HQ Fantastic Four #66.

Se pensarmos bem, perceberemos como isso é algo realmente notável. Pois em apenas vinte edições, essa dupla criativa consegue moldar a Marvel Comics para as décadas seguintes.

Criado por esses dois monstros dos quadrinhos, Warlock era conhecido apenas como Ele e só assume o seu verdadeiro nome, cinco anos depois. Embora eles não soubessem disso na época, Jack Kirby e Stan Lee estavam criando um dos maiores defensores e também uma enorme ameaça para o Universo Marvel. Mais do que isso, os dois criam o personagem perfeito para discutirmos, mesmo metaforicamente, a presença da religião no mundo e como ela está presente nas mentes criativas.

Adam Warlock é um ser criado através de um experimento científico, mas por um grupo de cientistas com uma agenda totalmente destrutiva, conhecido como Enclave. Ou seja, essa equipe cria Warlock para acelerar a destruição do nosso Universo, pois ele é um ser geneticamente perfeito. Pois apesar de ter um padrão de força elevada, velocidade, durabilidade, resistência e vôo, Warlock também é capaz de absorver e canalizar Energia Cósmica. Mas isso não é tudo. Ele também pode retornar ao seu casulo e se curar de praticamente qualquer coisa.

O Enclave queria que Ele, como ainda era conhecido, viajasse pela galáxia conquistando mundo após mundo. Porém, após perceber que ele era apenas uma marionete, Warlock se recusa a fazer o seu trabalho e, finalmente, liberta-se. Warlock viaja então para a Contra-Terra, uma duplicação do nosso planeta, que fica do outro lado do Sol. Chegando à esse planeta distante, Warlock passa a ser adorado como um Deus vivo.

Warlock é enviado à Contra-Terra por seu pai, o Alto Evolucionário, para vigiar o progresso nesse planeta. Após a sua chegada, o vilão Homem-Lobo o segue e ameaça destruir esse mundo. Ele, agora chamado Adam Warlock, se sacrifica para poder salvar o planeta e poucos dias depois, ressuscita dos mortos, como alguém que conhecemos. Esse tema mostra a conexão do personagem com a religião, algo que acompanha Warlock por vários anos.

Apesar de ser criado por pessoas, Warlock é muito diferente de qualquer ser humano. Ele não é afetado pelo destino, no seu sentido tradicional, e isso significa que o seu futuro não pode ser visto por aqueles que fazem previsões. Porém, a sua diferença em relação aos humanos não termina aí. A Gema do Infinito que ele usa na cabeça e a Manopla do Infinito, que ele roubou de Thanos, fazem com que ele seja praticamente um Deus.

Apesar de Stan Lee e Jack Kirby terem criado Warlock, é a dupla Jim Starlin e Roy Thomas que transforma o personagem no que ele é hoje, veja Nessa HQ. Após esses dois mega-criadores, sua histórias abordam a complexa origem de Warlock. Eles não apenas lhe oferecem a profundidade necessária, mas também oferecem ao leitor um vislumbre de como Warlock realmente era semelhante à Deus. Até Roy Thomas já disse que o musical Jesus Christ Superstar, foi uma fonte de inspiração importante para os dois.

Por mais que Roy Thomas introduza a religião no universo de Warlock, chegando até a mudar o seu nome para Adam, uma mistura de Adão e Eva, é Jim Starlin que merece a maior parte do crédito. Thomas até disse que o trabalho de Starlin ultrapassa os limites de qualquer história em quadrinhos.

Jim Starlin continua sendo um dos escritores e desenhistas mais influente dos quadrinhos. A primeira vez que li uma história dele, na antiga revista Heroís da TV, fiquei fascinado pelo traço detalhista do seu Adam Warlock. Hoje, depois de rever algumas histórias, percebo com mais clareza porque Warlock consegue cativar a mente dos leitores de quadrinhos, por várias gerações. Mas ele fez isso com muita naturalidade e, lógico, histórias bem complexas. A maioria dessas histórias têm uma coisa em comum: todas elas envolvem personagens, lugares e eventos fora da Terra. A compreensão do cosmos e como Jim Starlin o desenha, é algo incomparável. Basta olhar para o seu trabalho nessas HQs: A Morte do Capitão Marvel, ou Manopla do Infinito e The Thanos Quest.

Adam Warlock e Magus

Sob o olhar atento de Stalin, personagens como Drax, o Destruidor e Thanos nascem e crescem no Universo de Adam Warlock. Por isso que o Warlock, de Jim Starlin, está totalmente ligado à Gema da Alma, algo que prepara o cenário para uma vida cheia de batalhas, contra Thanos.

O seu grande épico espacial e diria que também o mais importante, é a Saga Magus. Essa HQ, literalmente, transforma Adam Warlock nesse personagem trágico que conhecemos hoje. A história mostra Warlock tentando salvar uma mulher de um grupo de religiosos radicais mas, o que ele não percebe, é que ela estava realmente procurando-o.

Essa personagem queria ajudá-lo a resistir ao poder da perigosa, mortal e opressiva Igreja Universal da Verdade. Após um pequeno diálogo na HQ, o leitor e Adam descobre que o líder da Igreja Universal da Verdade é um ser conhecido como Magus, uma versão futurista de Adam Warlock, embora seja azul e com um cabelo afro.

Nessa hora descobrimos que Magus é uma versão mais poderosa de Adam Warlock, pois é criado após sua mente ser corrompida. Magus acredita que todos os seres devem servir a um propósito, que é adorá-lo ou o destino deve ser a morte.

Percebendo que ele próprio é esse Magus semelhante à Deus e quanta destruição ele causará, Warlock compreende que ele deve se prevenir de sua própria transformação maligna. Por isso ele resolve viajar no tempo, para enfrentar Magus. Ele sabe que se matar o Magus do futuro, sua versão do presente não existirá. Depois de chegar ao futuro, ele encontra Magus agonizando e, após sua morte, Warlock usa a Pedra da Alma para absorver a dele, evitando assim que Magus e a Igreja Universal da Verdade existam.

O que torna isso tão notável, é que Adam Warlock abraça totalmente o que o leitor já havia percebido. O personagem deve se sacrificar mais uma vez e, para o bem do universo, ele deve ser o messias da Marvel.

Starlin usa brilhantemente Warlock e Magus como uma metáfora para aqueles que seguem a fé de maneira cega. Por isso o personagem Warlock passa a ser conhecido como o Messias do Universo Marvel. Pessoas, seres e planetas inteiros o seguem, apenas por ele ter se sacrificado mais de uma vez. Com o surgimento de Magus, essas mesmas pessoas também o seguem, alienadamente, depois que ele viaja de volta no tempo e chega ao passado. Ao criar Magus, Starlin até chega a falar diretamente sobre a igreja. Ele, metaforicamente, cria um argumento sobre seguir alguém, ou algo, sem questioná-lo. Jim Starlin pergunta por que as pessoas acreditam em Deus ou na Igreja, sem pensar naquilo que está sendo pregado.

Essa Saga da Marvel permite que Jim Starlin se recupere totalmente de sua vida católica, algo que o consome quando ele ainda era criança. Certamente isso o afetou muito, pois ele disse: “Eu li alguns livros, fiz algumas aulas de psicologia em uma faculdade comunitária. Então eu tinha algum interesse nisso, além de todo o catolicismo…. Eu cresci muito católico, numa escola paroquial, e Warlock consegue resolver tudo isso”. Podemos perceber que a Saga Magus é na verdade uma saída para falar sobre tudo aquilo que o incomodava sobre religião. Starlin ataca esse passado religioso, mas de forma metafórica, nessa grande saga dos quadrinhos.

Na Saga Magus, Starlin não esconde o fato de que Warlock e Magus são a sua própria interpretação sobre uma doutrina religiosa e chega a fazer uma referência direta à Jesus Cristo. Pois ele mostra o que acontece quando uma religião tem muito controle sobre os seus seguidores. Ou seja, quando a igreja tem muito poder, ela pode corromper qualquer pessoa. Starlin não esconde o que estava tentando realizar e consegue conscientizar os seus leitores sobre os perigos de seguir, cegamente, uma religião. Principalmente sem refletir o que essa crença realmente transmite.

Adam Warlock, de Jim Starlin, nasceu fora de época, exatamente quando a Comics Code Authority censurava as revistas em quadrinhos. Por isso esse tema metafórico consegue ser habilmente escondido atrás de algumas imagens psicodélicas e inimagináveis. Pois cada página de Warlock possui cores e personagens, que só poderiam ter sido criadas pela mente de Starlin e de alguns outros criadores fantásticos, como Englehart e Brunner, responsáveis pela fase sensacional e alucinante do Dr. Estranho.

Adam Warlock é um personagem complexo e quando li as primeiras histórias, na Revista Heróis da TV e Superaventuras Marvel, nem percebi que Jim Starlin tentava passar uma mensagem sobre o seu passado religioso e como isso afetava a sua mente. Isso prova que várias histórias em quadrinhos não foram criadas para crianças lerem. Como Warlock, Jim tenta expurgar aquilo que lhe faz mal e cria um herói tragicamente moral, forçado a ter uma escolha imperfeita. No entanto, o seu verdadeiro heroísmo é rejeitar essa guerra santa que ele estava sendo preparado para liderar.

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