Fama mostra que a janela para o sucesso pode ser estreita e cruel

Sempre é difícil encontrar o filme Fama nas plataformas de streaming, mas agora esse clássico do cinema está disponível na Max, para você assistir quantas vezes quiser.

Elenco do filme

Vi esse filme no cinema quando ele foi lançado e a mensagem era clara, você nunca deve desistir dos seus sonhos. Mas você provavelmente precisará modificá-los em algum momento, especialmente se os seus eles envolvem uma carreira artística.

Estamos neste planeta por um período de tempo muito finito, mas ele é ainda mais curto quando nos dedicamos à dança, música, atuação e várias outras carreiras artísticas. Simplesmente não há uma data de validade para se tornar um artista de sucesso. Porém, a grande maioria acha que a autopromoção, no mundo louco das Redes Sociais, consegue oferecer o impulso necessário para a fama. Atuação, dança e música têm janelas muito mais estreitas para o sucesso, e elas estão muito fora do alcance da maioria das pessoas.

O Filme Fama, de Alan Parker, mostra uma grande verdade sobre o show business e também sobre a vida. Quem assiste Fama percebe que ser apenas talentoso e ambicioso, não é o suficiente para vencer.

Dividido em 3 capítulos, equivalentes aos anos do secundário americano, o filme acompanha as histórias de pessoas que sonham com uma carreira significativa no show business, mas destaca, desde o início, a frustração. Uma das personagens queria ser bailarina, então convida um amigo para fazer com ela o teste de habilidade específica. Ele que nem tinha o primeiro grau completo, mal sabia ler e não estava nada interessado em educação formal, é aprovado. Interpretado pelo ator Gene Anthony Ray, Leroy Johnson é a cara da rebelião e da inconformidade dos negros naquela escola. Mesmo depois de aprovado, ele não tem paciência para as aulas teóricas e desafia o estabelecimento. Porém, como o jovem tem um talento inato, os professores nunca desistem dele. Já a amiga, que falhou no teste, sai de cena derrotada.

Ao longo do filme, somos apresentados aos mais diversos dramas: os latinos Coco Hernandez e Ralph Garcey, o ítalo-americano Bruno Martelli, o irlandês Montgomery MacNeil e a judia Lisa Monroe são do grupo dos estranhos ao ambiente WASP dos EUA. No entanto, eles são o recheio mais delicioso que esse drama pode ter. Suas histórias se entrecruzam com amor, música, dança e aulas de teatro. Tudo isso para mostrar o quanto é importante saber o que se quer falar, para falar com propriedade. Assim atingimos a um número maior de espectadores, leitores e plateia, algo essencial para quem é artista.

A explosão dos alunos nas ruas de Nova Iorque

Fama fala através da música e tem uma trilha sonora com canções animadas e otimistas. Essa músicas contrastam com a rejeição, contratempos cruéis e sonhos frustrados, exatamente o que os personagens experimentam no filme. Além disso, existem as intermináveis horas de aulas de dança, música e atuação, pois os alunos devem manter um currículo acadêmico rigoroso. Afinal, eles precisam viver como se já fossem artistas profissionais.

Como naquele tempo não existia o TikTok e o talento não era efêmero, só restava aos personagens um trabalho constante e muito suor. Tudo isso para que, no final, eles alcançassem alguma ou quase nenhuma recompensa, mas muitas dores nas canelas. Os números musicais revelam aqueles momentos de diversão, que são apenas fantasias. Extamente como o público imagina a vida em uma escola de artes cênicas. No entanto, Alan Parker nos traz de volta rapidamente à realidade e mostra uma das cenas mais duras do filme.

A cena apresenta a rica Hilary (Antonia Franceschi), grávida, falando em prantos, com uma enfermeira de uma clínica de aborto. Hilary diz que tem grandes sonhos e toda sua vida foi planejada para ela ser uma bailarina profissional. Porém, como o mundo capitalista é cruel, a enfermeira apenas pergunta num tom neutro: “o que você disser, querida”, e finaliza perguntando se ela vai pagar com American Express ou Mastercard.

Pôster Original do Filme Fama.

Cada personagem de Fama tem o seu drama particular, Montgomery, vivido por Paul MacCrane, canta uma das canções mais lindas do filme, depois utilizada no comercial de calças USTop (isso denuncia a idade, mas, fazer o quê?) “Is It Ok If I Call You Mine”.

Em 1980, embora Stonewall já tivesse acontecido 11 anos antes, a questão homossexual ainda era muito velada e Montgomery se apaixona por Ralph e canta para ele esse hino romântico, que traduzo livremente: “Tudo bem se eu te chamar de meu, só por pouco tempo? Eu vou ficar bem se eu souber que você sabe que eu quero, preciso do seu amor.” Lógico que Ralph o rejeita, mas aceita um beijo e a cena é muito lírica.

Fama acontece na década de 80, uma época em que a informática dava passos lentos, ninguém sonhava com uma rede mundial de computadores e a popularização dos PCs não passava de um desejo do Steve Jobs. Fazer sucesso no mundo das artes e do entretenimento custava muito sangue, suor e lágrimas e a guerra por um lugar ao sol era muito acirrada. As plataformas de divulgação de conteúdo ponto a ponto, como o YouTube e as Redes Sociais subverteram essa lógica, tornando tudo bem mais rápido, fácil e, consequentemente efêmero.

Fama teve uma regravação em 2009, mas que eu não tive interesse em ver, pois o filme original sempre será eterno. Alan Parker fez questão de mostrar adolescentes reais, como todos nós já fomos, e eles são muitas vezes egoístas e infantis, voltando-se uns contra os outros no momento em que a insegurança aparece e por isso o filme é tão real.

A música de encerramento, a animadora e esperançosa “I Sing the Body Electric”, é muito chocante. A maioria dos alunos, antes mesmo de se formar no ensino médio, experimentou o gostinho de como o show business será implacável, mas eles vão continuar tentando de qualquer maneira. É tudo o que eles sabem fazer e o mundo continua gerando sonhos e uma leve esperança de que tudo pode melhorar.

Artigo em parceria com o Incansável Encantamento

Abaixo você pode assistir ao trailer original do filme Fama.

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